Tema da redacao do enem 2023

Desafios para o enfrentamento da invisibilidade do trabalho de cuidado realizado pela mulher no Brasil

A redação do Enem é um dos pontos-chave da prova, onde o aluno precisa elaborar uma dissertação com argumentos a respeito do tema proposto, ou seja, deve trazer seu ponto de vista para a situação problema apresentada.

Tradicionalmente o Enem dá luz a questões relevantes para a redação. Este ano, não foi diferente: tratou da invisibilidade do trabalho de cuidado, que é expressivamente realizado pelas mulheres, não somente no Brasil mas tradicionalmente, no mundo.

Ocorre que o mundo mudou. E muito. Atualmente a mulher está presente em praticamente todas as funções e profissões do mercado, está estudando e tendo menos (ou nenhum) filhos. Além disso, o advento da longevidade acrescentou o cuidado com pais, avós e sogros idosos.

O IBGE tratou da questão em dados do Censo 2022: 

  • Em 2019, as mulheres dedicavam 10,6 horas a mais do que os homens aos afazeres domésticos e/ou cuidados de pessoas. Em 2022, essa diferença era de 9,6 horas.
  • Apesar dessa pequena redução, 92,1%% das mulheres com 14 anos ou mais realizaram afazeres domésticos e/ou cuidado de pessoas em 2022, enquanto apenas 80,8% dos homens desse grupo etário estavam envolvidos nessas atividades. Os homens da região Nordeste mostraram a menor taxa de realização: 73,9%.
  • A divisão das tarefas domésticas permanece desigual mesmo entre os trabalhadores: em média, as mulheres ocupadas dedicaram 6,8 horas a mais do que os homens ocupados aos afazeres domésticos e/ou cuidado de pessoas em 2022.
  • No país, a taxa de realização de afazeres domésticos entre as pessoas com 14 anos ou mais de idade passou de 85,9% em 2019 para 85,4% em 2022, ou o equivalente a 148,1 milhões de pessoas nesse grupo etário realizando aquelas atividades.
  • A realização de afazeres domésticos era maior entre homens com curso superior completo (86,2%) e menor entre os sem instrução ou com ensino fundamental incompleto (74,4%).
  • As mulheres que se declararam pretas tinham a maior taxa de realização de afazeres domésticos (92,7%).
  • A taxa de realização de cuidado de pessoas caiu de 33,3% em 2019 para 29,3% em 2022, ou o equivalente a -5,3 milhões de pessoas.
  • No período, considerando o cuidado no domicílio, houve redução do cuidado de crianças de 0 a 14 anos e aumento do cuidado de moradores de 15 a 59 anos e de idosos.

Gráfico com o panorama de cuidados de pessoas e afazeres domésticos

No gráfico acima, a faixa roxa representa o percentual de mulheres e a faixa bege, dos homens, em horas por semana. 

Além disso, os dados divulgados pelo IBGE mostram que, embora os percentuais de “cuidado” tenham diminuído, a mulher segue como a principal cuidadora, seja no âmbito da família, seja como trabalho remunerado:

  • Cuidado de pessoas recuou de 33,3% em 2019 para 29,3% em 2022.  A taxa de realização desses cuidados se diferencia conforme o sexo: 34,9% das mulheres e 23,3% dos homens, em 2022.

O tema da redação do Enem foi, portanto, certeira: há uma invisibilidade da mulher nessa função de cuidar. O Estado não tem até o momento políticas públicas bem estabelecidas para mulheres cuidadoras, sobretudo auxílio para aquelas que deixam de trabalhar ou estudar para cuidar.

A chamada Geração Sanduíche, formada por mulheres que se desdobram entre o cuidado com filhos pequenos ou adolescentes e pessoas idosas da família é marcada por sobrecarga, altas taxas de estresse e maior suscetibilidade à doenças, muitas vezes em detrimento do autocuidado, pela falta de tempo.

Cuidar da casa nunca foi um trabalho visto, sequer valorizado. Embora os números do IBGE mostrem uma pequena parcela de homens que dividem tarefas domésticas, eles são de nível superior e bem aquém do necessário. A maioria dos homens ainda não se deu conta que o mundo mudou e que é preciso adaptar-se.

A tecnologia veio dar uma “força” para esse trabalho essencialmente desempenhado pelas mulheres. Mas (ainda) não são robôs, que basta programar e deixá-los agirem. As mulheres tem direitos que precisam ser reconhecidos e respeitados. Têm direito ao lazer, ao ócio, ao descanso. Direito de serem cuidadas também.

Parabéns aos profissionais que formularam o tema. E que venham avanços na percepção sobre os cuidados para que a mulher saia,definitivamente do papel de cuidadora invisível e que as gerações mais jovens possam contar com políticas públicas de cuidados mais  efetivas.